– com Martha Funke, da Rede de Comunicadores da Liderança do PT
Dando sequência à série “CORONAVÍRUS: ALÉM DOS NÚMEROS”, apresentamos dois depoimentos que retratam as dificuldades enfrentadas por trabalhadoras e trabalhadores que não têm a opção de trabalhar à distância, em regime de teletrabalho (o famoso home office). Moradoras de bairros periféricos de regiões diferentes da cidade de São Paulo, elas comentam as dificuldades enfrentadas para cumprir a jornada diária de trabalho.
Diante do decreto de situação de emergência e calamidade pública no município, decorrente da pandemia de Covid-19, o governo do estado de São Paulo determinou o fechamento do comércio e todos os serviços não essenciais. Supermercados, hipermercados, padarias e açougues podem continuar abertos; já os bares, cafés e restaurantes devem permanecer fechados para o público, podendo funcionar por delivery. A decisão sobre a forma de trabalho, contudo, depende de acordo entre o patrão e o empregado – cuja assimetria de poder determina, na prática, uma decisão unilateral do empregador.
Reveja as duas primeiras histórias retratadas pela série:
+ UMA MÃE AFLITA NO PARQUE FERNANDA
+ UM PAI TENTANDO ALIMENTAR SEU FILHOS
QUANDO A QUARENTENA NÃO É UMA OPÇÃO
Hoje vamos contar a história de duas trabalhadoras, que vivem em regiões diferentes da cidade de São Paulo, mas ambas funcionárias de uma loja que vende chocolates na rua Pamplona (região da avenida Paulista). A primeira delas é a Nayara Rodrigues de Castro, 29 anos, casada com Rosimar e moradora de Itaim Paulista, zona Leste. A outra é a Paula Francine Rodrigues Silva, 34 anos, casada com Tiago, com quatro filhos – Fabrício, 18, Eduardo, 15, Gabriel, 12, e Daniel, 6, moradores do Jardim Vista Alegre, na zona Norte.
NAYARA (à esquerda): “Eu pego trem e metrô e venho andando da estação Trianon Masp até aqui [o seu local de trabalho]. Levo no mínimo uma hora, porque meu marido consegue me levar até a estação de trem mais próxima da minha casa. Aqui só paga a condução de um ônibus, mas não tenho de pegar e se tivesse demoraria quase duas horas. O metrô está mais vazio, sempre tem equipe de limpeza e dentro a maioria anda de máscara e luva. Eu não uso porque a empresa não fornece, a gente ganhou hoje de uma cliente, a máscara… e está sempre passando a mão e a maquininha [de pagamento] no álcool gel o tempo todo.
A loja está meio aberta, hoje a gente já ia fechar [2 de abril, por volta das 19h, dia da entrevista] mas o dono passou aqui e falou que não era para fechar que ele tinha mais entrega para fazer e era pra gente esperar. A gente fica aberto mas de certa forma corre até um risco, porque é a única loja aberta aqui… O dono tem mais cinco lojas e não passa todo dia aqui, hoje passou porque tinha entrega.
Eu abro a loja e tenho muito medo de ficar doente. Moro sozinha com meu marido e ele está trabalhando também, em oficina mecânica, não fecharam. Meu tio trabalha em hospital, na parte de limpeza, no [Hospital do] Graac, e está doente… só que não foi confirmado porque os médicos não quiseram encaminhar, deu pneumonia e ele está em casa tomando medicamento.
Aí a gente ficou assim [com medo]… Porque tem de frequentar a casa dele também, meu tio e minha mãe moram juntos. Ela toma todos os cuidados, né, mas já tem 59 anos. Pelo menos fiquei com trabalho, a gente ficou afastada no começo, depois uns dias de férias em casa e retornamos de novo no dia 6 de abril.”
PAULA (à direita): “Eu pego três ônibus, um até o terminal Cachoeirinha, do terminal até o Limão e do Limão para cá. Com menos trânsito dá uma hora e pouco. Moro com esposo e quatro filhos e quando eu chego em casa passo direto pro banheiro, mesmo porque meu filho Gabriel tem asma e eu sou cardíaca, estou no grupo de risco…
Já vi equipe de limpeza no terminal Cachoeirinha, quando a gente entra no ônibus a equipe acabou de sair. Meu marido foi dispensado, trabalhava em obra, registrado, está de aviso prévio mas ainda ia fazer seis meses, não sabemos se dá tempo para pedir o seguro-desemprego.
Ninguém está indo para a escola, meu filho do meio ia tentar ontem, não estava conseguindo [fazer as aulas online]… aí a gente viu uma reportagem ensinando a tentar de novo, mas não estava conseguindo acesso. E também não recebi nenhum material didático do mais novo, que está na creche. Disseram que iam mandar material pedagógico mas não veio.”