Enchentes não são apenas fatalidade divina
Entre 2017 e 2018, gestões Doria e Covas (PSDB) gastaram apenas um terço das verbas de combate às enchentes na cidade de São Paulo
por Juliana Cardoso*
Não é de hoje que a cidade de São Paulo sofre com as fortes chuvas de verão.
E não é de hoje que os governos, sobretudo os tucanos, culpam São Pedro pelas tragédias provocadas pelas enchentes e pelos deslizamentos de encostas.
Assim como o rompimento da barragem de Brumadinho, em Minas Gerais, a tragédia não é somente ambiental. Tem o dedo do homem, tem a sede da ganância dos lucros.
No caso da Grande São Paulo, o caos da noite de 10 de março, que causou 18 mortes, pode perfeitamente ser creditado como resultado da omissão e descaso dos governantes.
Ao examinar, recentemente, o orçamento da Prefeitura, a urbanista Raquel Rolnik chamou a atenção para a falta de prioridade da atual gestão Bruno Covas (PSDB) nas intervenções de combate às enchentes.
“Foram simplesmente zerados os investimentos em obras contra enchentes e uma enorme soma foi concentrada em pavimentação de vias em 2018. Parece então que as enchentes não são uma fatalidade divina, mas claros produtos de opções de política urbana”, escreveu em artigo.
Os números da execução orçamentária confirmam.
Em 2017 (gestão Doria) e 2018 (Covas) foram gastos um terço do orçado para tal finalidade. De R$ 824 milhões para drenagens, só R$ 279 milhões (38%) foram aplicados.
Em obras e monitoramento de enchentes, estavam previstos R$ 575 milhões, mas apenas R$ 222 milhões (35%) foram investidos. Mas os recursos com recapeamento de vias foi multiplicado seis vezes no período – saltou de R$ 44 milhões para R$ 293 milhões.
Apesar do prefeito Covas alegar problemas financeiros, nos últimos dois anos a arrecadação com impostos cresceu 12,5%. No ano passado, ela superou em R$ 300 milhões a estimativa da gestão.
Também responsável pelos rios da cidade e por obras de drenagem, o papel do governo do Estado no combate às enchentes beira o descasco.
Nos quatro anos da gestão Geraldo Alckmin/Márcio França estavam previstos R$ 3,2 bilhões no combate às enchentes.
Mas foi investido somente R$ 1,5 bilhão (46%). No ano passado dos R$ 36 milhões orçados para construções de piscinões, foi gasto apenas R$ 1,6 milhão (6%). No orçamento de 2019 do governo do Estado, não há previsão de gasto com obras de piscinões.
Aprendemos desde a infância que os temporais de verão são dádivas da natureza. A decisão política de investimentos e de prioridades, porém, está na terra, obviamente com os governantes.
*Juliana Cardoso (PT) é vereadora, membro da Comissão de Saúde da Câmara Municipal de São Paulo.