– com Martha Funke, da Rede de Comunicadores da Liderança do PT
A página da Liderança do PT na Câmara Municipal de São Paulo inicia nesta quarta-feira, 1º de abril, a série “CORONAVÍRUS ALÉM DOS NÚMEROS”, retratando a forma com que a crise sanitária, provocada pela pandemia de Coronavírus, tem afetado a vida das pessoas na maior cidade da América Latina.
Se é verdade que São Paulo comporta várias cidades dentro de uma só, é igualmente real que essa afirmação não pode esconder as profundas e perversas desigualdades de um município com 12 milhões de habitantes, 1.521 km² de extensão territorial e que representa quase 32% do Produto Interno Bruto (PIB) do País – perdendo em arrecadação apenas para a União e o estado de São Paulo.
A primeira história é a de uma trabalhadora doméstica, mãe e chefe de família, moradora da zona Sul de São Paulo, que deixa nítida a distância entre as iniciativas anunciadas pela Prefeitura e o governo do Estado de São Paulo e a vida de dificuldades de quem reside nas periferias. Ela foi entrevistado por Martha Funke, da Rede de Comunicadores da Liderança do PT, que é uma das colaboradoras desta série – que, aliás, só está sendo possível por conta desta Rede.
UMA MÃE AFLITA NO PARQUE FERNANDA
Natalina Bastos, diarista, 42 anos, mãe do Bruno, 19, e da Sara, 6. A família vive no Parque Fernanda em uma casa que, apesar de própria, tem 36 m² e fica ao lado de um córrego com esgoto a céu aberto. Os três cômodos, com um quarto em construção, estão localizados em uma área de ocupação, próximo ao Capão Redondo, periferia da zona Sul de São Paulo. Lá são 19,5 mil habitantes por km² (para comparação, o Jardim Paulista tem 124,4 habitantes por km²).
“Não estou indo trabalhar e o Bruno foi dispensado. Nós três ficamos gripados. Começou comigo, com dor de garganta, depois o Bruno, depois a Sara. O Bruno chegou a ir no médico do posto, disseram pra ele que não era nada porque ele estava só com dor de garganta e dor de cabeça.
Eu e Sara ficamos pior, com tosse, nariz escorrendo, mas a Sara já está melhorzinha. Nem fui no posto, tenho medo de pegar alguma coisa lá. Passei em frente ao posto no dia que começou a vacina e fui pedir informação para enfermeira, mas veio um policial e mandou embora porque parou outra mulher do lado e não era pra conversar mais de duas pessoas. Dizem que quem tem baixa imunidade pega mais fácil, coimo eu estou toda zicada melhor não ir mesmo.
Até agora não passou ninguém aqui orientando nada, nem agente de saúde, nem a enfermeira do posto de saúde do Parque Fernanda, eles vêm todo mês. É devido o tumulto, todo mundo procurando, com gripe, não teve tempo de passar, né?
Não estou indo trabalhar e todo mundo disse que vai pagar mesmo assim, não sei se depois vão descontar, mas eu não passando necessidade, tudo bem. Quarta-feira que vem tenho de ir na dona Agnes, que está sozinha com o marido (é uma senhora de 83 anos com marido acamado). Os filhos têm família, estão isolados em casa, um viajou para um lugar destes com muita gente infectada, o teste deu negativo mas ele está trancado em casa trabalhando. Ele que me paga e pediu para ir semana sim, semana não, porque dona Agnes não pode fazer nada, nem limpar banheiro nem nada, os filhos fazem as compras e deixam lá. Vou ver na terça-feira com o filho dela se é para eu ir mesmo, depois desse resfriado.
A gente sai assim mesmo de vez em quando para ir no supermercado. Não tem máscara, luva, álcool gel, nada. Não sei se vão pagar os direitos do Bruno, ele trabalhou mais de um ano mas tinha registro só cinco meses e não vai receber o seguro desemprego, precisa de um ano registrado. Ele tinha até mudado de cargo, gerente de estoque da firma, uma fábrica de manequim. Ainda não teve ninguém diagnosticado no bairro, mas a mulher da reunião (reunião periódica com candidatos a empreendimento do Minha Casa, Minha Vida) disse que tem uma pessoa em quarentena e não vai mais ter reunião por conta disso. Aqui perto sei que uma pessoa morreu no Taboão (da Serra), com teste confirmado. Era mais novo, mas tinha problema de saúde.
Levo a Sara lá fora pra tomar um solzinho, sem falar com ninguém. O mercado é pertinho e toda hora a gente vai lá. Tá todo mundo em casa, aqui é sempre uma muvuca, mas tá um deserto. Ontem ouvi na televisão que eles vão mandar uma carta pra quem é autônomo ou desempregado para pagar os 200 reais. Também falaram que vão dar 50 reais pra criança. Vou esperar pra ver, não acredito nessas coisas não. Nunca ouvi falar da proposta de um salário mínimo para todo mundo até acabar a crise.”