ARTIGO – Bolsonaro em barraco com próprio partido

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Acompanhamos nos últimos dias algo jamais visto na história recente da República. Um presidente em guerra não apenas com a oposição – contra a qual este profere constantes ameaças; mas também contra o seu próprio partido.

Há pouco mais de um ano poucos haviam ouvido falar no Partido Social Liberal – o PSL. Tratava-se de um partido nanico, uma legenda de aluguel. Fundado em 1994 pelo empresário pernambucano Luciano Bivar, o partido passou mais de 20 anos na insignificância.

Em 2015, a sigla passou a buscar relevância no cenário partidário num esforço de aglutinar defensores do liberalismo, abrigando o movimento em ascensão Livres. Entretanto, às vésperas das eleições de 2018, Bivar traiu o movimento liberal para recepcionar o capitão da reserva Jair Bolsonaro. Este, que viria a ser presidente, já apontava à época sua total deslealdade ao descumprir acordo com o Patriota (ex-PEN), que havia mudado de nome apenas para abrigar o seu projeto presidencial.

Desde que assumiu a Presidência da República, Bolsonaro se choca com os mais distintos setores da sociedade nacional e internacional. No que diz respeito ao tratamento com a esquerda e os movimentos sociais sua virulência já era conhecida. O seu discurso de ódio contra as minorias políticas e sociais também não cessou na cadeira presidencial.

O desprezo à causa ambiental e com a educação são gritantes e as críticas ao governo são recebidas com desdém e retrucadas com violência totalmente não condizentes com o cargo. Foi assim com o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Felipe Santa Cruz e a Comissária de Direitos Humanos da ONU, Michelle Bachelet. E até com chefes de Estado como Macron e Angela Merkel.

Mas recentemente, para espanto geral, o presidente chocou-se contra o seu próprio partido. Seria natural esperar certo conflito interno diante da sua queda acentuada de popularidade. E diante da dificuldade em explicar as contradições do seu discurso moralista. Seu partido é investigado no caso do “Laranjal” e Bolsonaro, preocupado, poderia estar tentando descolar-se para evitar desgaste. Entretanto, o PSL representa a segunda maior bancada da Câmara Federal, conta com um número de filiados crescente, e tem uma série de pré candidaturas às prefeituras em 2020. Todavia, é difícil falar em descolamento da corrupção quando é nítido o envolvimento do próprio filho do presidente com milicianos.

Fato é que Bolsonaro entrou em guerra com aparentemente mais da metade do PSL. Já destituiu, por exemplo, a líder do governo no Congresso Joice Hasselmann. Que afirmou que a traição é um modus operandi do governo Bolsonaro e em analogia racista, disse estar se sentindo “alforriada”.

O presidente derrubou também o Líder do PSL na Câmara dos Deputados Delegado Waldir para emplacar seu filho Eduardo Bolsonaro no posto. Não se sabe por quanto tempo.

Waldir foi gravado em reunião pelo deputado carioca Daniel Silveira, que reconheceu ter se infiltrado no grupo que articulava a manutenção de Waldir na liderança do partido.

“Eu vou implodir o presidente”, ameaçou o líder do PSL no áudio vazado. “Aí eu mostro a gravação dele. Eu tenho a gravação. Não tem conversa, não tem conversa. Eu implodo o presidente.” Durante a reunião ele ainda chamou Bolsonaro por vezes de “vagabundo”.

Nunca se viu tamanho amadorismo e irracionalidade à frente dos principais postos de poder do país. É inacreditável que um presidente entre em colisão contra sua base de apoio parlamentar por conta de uma disputa tacanha pelo controle do fundo partidário, ao passo que este tem um país com duzentos milhões de habitantes e um orçamento trilionário para administrar.

É importante que se diga, ainda, que o barraco entre Bolsonaro e seu partido também é um sintoma da irracionalidade que marca o sistema político-eleitoral brasileiro. Notamos uma série de legendas sem identidade, favorecendo a fragmentação e o clientelismo.

Para uma democracia sólida é fundamental a presença de partidos fortes, ideológicos, com organicidade e base social, como é o caso do PT. O Partido dos Trabalhadores representa um setor relevante da sociedade brasileira. Nasceu no seio da classe trabalhadora. Com o novo sindicalismo, setores importantes da Igreja, com intelectuais. E com bandeiras que representam milhões.

Assim, tradicionalmente defendeu uma reforma política no país com o intuito de fortalecer a democracia brasileira. Defende um sistema eleitoral baseado no voto em lista fechada, favorecendo os partidos ideológicos. E o financiamento exclusivamente público de campanhas eleitorais, dificultando o desequilíbrio promovido pelo poder econômico.

Fato é que já tivemos no país, no início da década de 90, a aventura moralista e personalista de Collor e vimos no que deu. Agora dobramos a aposta com ares neofascistas. E o que temos é a deterioração completa do Brasil nas mais diversas esferas. A economia patina, relegando grande parte do nosso povo ao desemprego e desalento.

É fundamental que todos os democratas brasileiros nos levantemos neste momento contra os desmandos desse governo, que está levando ao desmonte da nossa ciência, à entrega dos nosso patrimônio e à destruição dos nossos recursos naturais. E encampe a bandeira das reformas estruturais. Não estas que Bolsonaro propõe contra os trabalhadores, mas as reformas populares.

Diego Pandullo é advogado, diretor da União Nacional dos Estudantes e compõe a assessoria técnica da Liderança do PT na Câmara Municipal de São Paulo

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